A Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (TRT/MS) manteve, por unanimidade, a sentença que reconheceu a rescisão indireta do contrato de trabalho de uma atendente de telemarketing. A decisão, fundamentada no artigo 483, alínea “d”, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), teve como relator o desembargador Francisco Filho.
A trabalhadora, contratada em março de 2023, recebia um salário de R$ 1.512,95 e teve seu turno alterado unilateralmente pela empresa, apesar de ter informado que não poderia cumprir o novo horário. Ela alegou que a mudança afetava diretamente sua rotina, pois precisava cuidar de seu filho pequeno, matriculado em uma escola de período integral. Sem condições financeiras para contratar ajuda, ficou em uma situação insustentável, agravada por perseguições no ambiente de trabalho.
Embora a empresa tenha alegado que a mudança foi acordada, os depoimentos e documentos apresentados no processo mostraram o contrário. O superior hierárquico da trabalhadora, ouvido como informante, admitiu que a maioria dos colegas não possuía filhos e que apenas ela foi escolhida para mudar de turno. A decisão também destacou que a alteração não prejudicava apenas a trabalhadora, mas também a criança de dois anos, que ficaria sem os cuidados maternos após o horário escolar.
A juíza Déa Marisa Brandão Cubel Yule, responsável pela decisão em primeira instância, determinou que a empresa pagasse todas as verbas rescisórias, incluindo saldo de salário, aviso prévio, 13º salário proporcional, férias vencidas e proporcionais acrescidas de 1/3, FGTS com multa de 40% e salário-família. A empresa também foi obrigada a dar baixa na CTPS da autora com data de 20 de abril de 2024, considerando a projeção do aviso prévio.
O acórdão destacou a aplicação do Protocolo de Julgamento sob a Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que inverte o ônus da prova em casos de discriminação. A empresa não conseguiu demonstrar que a alteração contratual não teve motivação preconceituosa.
Ao manter a condenação, o desembargador Francisco Filho concluiu que a mudança compulsória do turno não decorreu do legítimo poder diretivo do empregador, mas foi uma prática discriminatória baseada no gênero e na condição de mãe da trabalhadora. “Tal conduta tinha como objetivo inviabilizar sua permanência no emprego, resultando em um pedido de demissão viciado”, afirmou o magistrado.
Além das verbas rescisórias, a empresa foi condenada ao pagamento de uma indenização por dano moral no valor de R$ 8.000,00. O relator do processo apontou que a trabalhadora sofreu discriminação indireta devido ao gênero e ao fato de ser mãe de uma criança pequena.
“A autora foi vítima de discriminação indireta em razão de gênero e do fato de ter uma criança de apenas dois anos que depende de proteção e cuidados especiais, o que leva à manutenção da sentença quanto à condenação em indenização por danos morais, inclusive quanto ao valor arbitrado, que entendo razoável, à medida em que esse tipo de indenização tem por objetivo constituir um lenitivo à vítima, sem representar enriquecimento, mas, e ao mesmo tempo, servir, pedagogicamente, como estímulo ao lesante para evitar novos danos”, afirmou o desembargador Francisco Filho.